quinta-feira, 29 de março de 2012

A realidade atual do fã de jogos de nave

Não é que eu queira puxar a sardinha para o nosso lado, mas de todos os gêneros de jogos de vídeo-game o que mais sofreu ao longo dos anos, principalmente após o início do novo milênio, foi o jogo de nave, ou shooter, ou shmup - um termo que surgiu junto com a popularização da Internet no mundo.

Presença nobre nas listas de títulos de 16 e 32 bits, os jogos de nave foram perdendo a visibilidade e a popularidade à medida em que evoluíram em direção à estética danmaku, também conhecida como bullet hell. Já na época do Dreamcast e do Playstation 2 a impressão que se tinha é que a esmagadora maioria, ou senão todos os jogos de nave, consistia de coisas impossíveis de serem vencidas ou mesmo desfrutadas casualmente devido ao elevado nível de dificuldade percebido, que era automaticamente associado à quantidade de tiros na tela. Infelizmente, boa parte da culpa dessa percepção recai sobre o famoso vídeo que mostra o último chefe de Mushihimesama Futari no modo Ultra.


O fatídico vídeo que deflagrou o medo

O gênero evoluiu e apenas uma pequena parcela dos jogadores evoluiu junto. Estes jogadores viriam a ser considerados fãs hardcore, um termo pra lá de polêmico. Afinal, é hardcore quem curte muito ou quem joga muito? Já quem não acompanhou a epopeia evolutiva que se seguiu a Batsugun e DonPachi se sentiu excluído por default. E o que dizer de novas gerações de gamers? A gurizada nem se atreve a chegar perto das coisas que saem no mercado hoje em dia, seja por puro preconceito ou por culpa do marketing de massa. E não adianta incluir modos NOVICE, BABY, SEM BALAS ou sei lá o quê.

Hoje existe uma pequena onda de ressurgimento emergente do mercado de celulares e outros dispositivos móveis. O resultado é que a exposição do gênero neste segmento específico tem sido muito maior do que o foi nas últimas gerações de consoles. Porém, se por um lado essa exposição pode trazer mais fãs para o gênero, o esvaziamento de títulos de qualidade para consoles ou PCs acaba por afastar exatamente os fãs de longa data, aqueles que ainda preferem a sensação tátil de apertar um botão ou segurar nas mãos um jogo em mídia física, concreta. Enquanto isso, o cenário indie conta com uma plateia que representa apenas uma gota num oceano, especialmente em terras brazucas. Enfim, não é possível agradar a todos.

Uma das reações mais comuns de um gamer diante dos jogos atuais do gênero

Dos parágrafos acima e de outras constatações relacionadas ao cenário atual do mercado, podemos tirar algumas conclusões crueis, porém verdadeiras:
  1. Jogo de nave é coisa do passado. A ação é só bidimensional, e não em 3D? Jogo de velho. A tela não gira quando aperto R2 ou L2? Jogo de Velho. Só usa dois ou três botões no controle? Jogo de dinossauro!
  2. A estrutura dos jogos de nave não se encaixa mais no formato mainstream. Os gamers de hoje são preguiçosos. 90% deles não querem ser desafiados, eles pagam por um jogo para verem todas as cenas animadas até o seu mirabolante final, depois ralam como retardados para conseguir 100% de achievements. Replay value? Minha nossa, o que será isso? Para essas pessoas o jogo deve ser uma experiência, não um desafio. Por definição, um bom jogo de nave sem desafio é uma porcaria, então aí está o paradoxo primordial que não permite uma aproximação de nenhum dos lados do espectro gamístico.
  3. Jogo de nave não existe para 99% dos jogadores de vídeo-game. Consequência direta dos fatores relacionados acima, se o jogo não tem gráficos super-ultra-modernos e visualização 3D hiperrealística ele não tem vez. Além disso, os "jogos são muito curtos e podem ser terminados em 20 minutos", não é mesmo? Que valor há nisso? NÃO TENTE ARGUMENTAR, EM 90% DOS CASOS NÃO VALE A PENA E VOCÊ SAIRÁ DA CONVERSA COM FAMA DE METIDO E CARA DE IDIOTA (UMA SAÍDA MENOS DOLOROSA É COMPARTILHAR ESTE LINK). Para testar a teoria em questão sugiro algo mais light: tente conversar de forma bastante informal sobre Raiden IV ou Deathsmiles em qualquer rodinha de "gamers" hoje em dia. O resultado da conversa? Considere-se afortunado se alguém conhecer pelo menos um dos jogos citados. Aposto que a maioria ouvirá algo como "Mano, tú não jogou o último Call of Duty? Cara, que mancaaaada!" e será rapidamente excluída, vitimada por olhares de enigmática indiferença. Uma ideia: registre os olhares do pessoal em fotos e envie aqui para o blogue.
  4. Ser fã de jogo de nave é viver em solidão gamística. Expandindo a ideia acima, analisemos o fato da maior parcela do apelo destes jogos estar relacionada ao conceito de desafio, pontuação e competição. Eles se bastam para quem é fã porque representam um fim em si mesmos, ou seja, não é necessário mais ninguém para que a diversão e o objetivo sejam atingidos (você compete contra si mesmo, basicamente). Por outro lado, este cenário conduz a um isolamento quase total, pois é muito difícil encontrar alguém por perto que se disponha a jogar, discutir e participar do processo de aprendizado e descoberta de um jogo de nave. É por isso que a maioria dos fãs se une por meio de sites e fóruns, e são estes meios virtuais que mantêm viva a chama do gênero.
  5. Atrair mais "público" para os jogos é uma tarefa muito árdua. Apesar de haver vários níveis de sucesso em casos isolados, não existe fórmula mágica. Além disso, quando um jogo de nave é bem sucedido demais ocorrem coisas toscas como o que aconteceu com Ikaruga, que se tornou a tábua sagrada de comparação para tudo o que veio em seguida durante anos. "Ah, esse jogo não é tão bom quanto Ikaruga, esse jogo não é nenhum Ikaruga, etc.". É por essas e outras que eu quase me atrevo a dizer que Ikaruga fez mais mal do que bem ao gênero, mesmo sendo um jogo somente mediano.
Enfim, sobre ampliar o apelo dos jogos de nave junto ao público, acredito que a abordagem a ser tomada deve ser pontual, ou seja, o que se pode fazer é expor "pessoas" a eles e deixar que elas se interessem naturalmente. E este blogue é nossa singela e orgulhosa contribuição para o movimento.
Omega Five: um dos últimos grandes jogos de nave originais para as mídias da geração atual, e que não é bullet hell

Vídeo-game é hobby e é diversão, isso é fato.
Que importa para mim ou para você se um gênero se tornou um nicho isolado?

Para nós importa porque o gênero está morrendo. Vários anúncios da Cave, a mais forte desenvolvedora atual, apontam para um fim do suporte aos lançamentos em disco no Xbox 360. Under Defeat HD no PS3 e no Xbox 360 é ótimo, mas isso só significa que a G.rev sobrevive (não sei como) das migalhas do passado.

Quando a classe dominante está assim tão titubeante é preciso se preocupar. Obviamente os jogos de nave não vão desaparecer se a Cave migrar completamente para tablets e Facebook, mas podem ter certeza de que o gênero sofrerá uma perda funcional e estética sem precedentes. A esperança, como muitos apontam, está nos jogos independentes. Que o diga nosso redator Tião Ferreira!

NOTA: nem tudo é triste em nosso mundo gamístico, shmuppers. Confira aqui a postagem seguinte sobre as vantagens de ser um fã de jogos de nave.

17 comentários:

  1. Cara, muito boa a matéria. Me identifiquei! Quando falo pra alguem que gosto de shmups recebo um "QUE"; se eu falo shooter pensam que eu to falando de COD! ai tenho que falar que gosto de jogo "de navinha" e a pessoa fala" aaah tipo r-type". Parabens pelo trabalho, a entrevista com o Gryzor muito boa tb!

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    1. Olá, Felipe. Desculpe pela demora em responder, só agora que vi que seu comentário tinha caído na caixa de spam!
      Agradecemos pelos elogios e olha só, pelo menos pra ti mencionam R-Type... hahahaha aqui nas minhas paradas nem disso se lembram!

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  2. Bom, de minha parte, já estou combatendo esse mal com a devida prevenção: vou comprar a licença "full" do game maker e do flash, vou criar uns 100 BONS jogos antes de morrer e abrir uma casa de arcades EXCLUSIVA com jogos de nave. Será como aquele hangar de WING COMMANDER - O REFÚGIO DOS ASES!

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  3. Rubens de araujo Julio9 de abril de 2012 às 22:27

    Meu caro, parabens pelo texto.. eu leio pouca coisa de blogs e o seu se destacou pelo menos para mim...
    Infelizmente isso está acontecendo...
    Bom, eu gosto muito de shooters apesar de não jogar muito bem... tenho um fliper lotado de jogos de shooter... meu sonho e se Deus quiser irei realizar é comprar uma maquina com monitor horizontal e só iria ter shooter!!

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  4. Obrigado pelo feedback, Rubens!
    Mas peraí, você tem um fliper lotado de shooters???? Onde fica?
    :)

    @ Tião
    Rapaz, se tu fizer isso aí baixo na sua cidade em um tapa pra conhecer o poderoso HANGAR!

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  5. Eu nem sabia que existia um termo (bullet hel) para a tempestade de pontos vermenhos, azuis , rosas e verdes que sufocam a tela de um jogo de nave. Nos arcades nunca fui muito bom nesse genero. Com pouco dinheiro e o medo da brincadeira acabar em 2 minutos, preferia os de Luta e os final fight da vida. Ai dava briga, sem querer fazer trocadilho. O unico que eu jogava decentemente era o Carrier Air Wings. Agora nos emuladores eu decidir me vingar dos tiozinhos que ficavam com todo o troco do pão. Que engano... Num jogo chamado ProGear, eu coloco de inicio 9 creditos e não termino no barato! Um pesadelo de tiros! E não tem bomba que resolva...
    Mas não desisto!

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  6. Outra coisa, talvez aqui não seja o espaço certo para falar nisso, mas vai assim mesmo. Tem um tempo que tento encontra um jogo de nave que me pertubou na infancia e consumiu todo o dinheiro que podia ter usando para comprar doce de amendoim e figurinhas do album do He-man.
    Bem... ele era vertical, não era uma nave e sim um robo que tinha um escudo. Um botão para tiro outro para usar o escudo. Acho que não tinha bomba. Deve datar entre 1985 e 1988. Quem puder me lembrar o nome desse maldito jogo para ver agora se ele vai me irritar, agradeço.

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  7. Eae, Rubinho!
    Valeu pelos comments, e não desista dos jogos de nave! Progear é osso mesmo, tem muito neguinho escolado que também não dá conta com ele.

    Sobre a sua dúvida, o único jogo que me vem em mente é Undeadline, que teve versões para o MSX2, o Mega Drive e o Sharp X68000.

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  8. Não era esse. Tento lembrar mais detalhes e só sai que era no espaço, que o escudo evoluia ficando maior e mais resistente aos tiros. Não lembro nem dos mestres nem como era os outro inimigos. Possivelmente o nome do jogo estava em japones. Falo isso pensando em outro jogo, de outro estilo, que chamavamos de "Picha-Picha" por causa do barulho que o boneco do jogo fazia ao atacar. Uma decada, ou mais , se passou antes de saber o nome do jogo que eu jogava razoavelmente bem. Era Rygar...

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  9. Vc lembra se era de arcade ou de console?
    Tenho em mente Papillon Gals do NES, que nos EUA se chamava Galactic Crusader ou algo assim.
    Mas provavelmente não seria esse, ou seria?

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  10. Tambem não era esse. O jogo era de arkade. Um controle só. Dois botoes. Single player. O tal escudo se movimentava para as laterais do robo e para frente.

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  11. Dangar. Em certos momentos, o robô forma um escudo à frente.Só consigo lembrar de Dangar, por enquanto.

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  12. Tb não é o Dangar. Acho que esse jogo vai ficar para sempre nas regiões da mente onde as lembranças se dissolvem.
    Bem... obrigado pelo o esforço de todos.

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    1. Mais um chute, Rubens: seria o jogo Armed Formation F, ou Formation Armed F como alguns o chamam?

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  13. Passaram-se os meses e o sonho de ter um Arcade Multijogos voltou. Encontrei um emulador Mame gigante com mais de 60 gigas. Depois de baixado, estou limando jogos que não funcionam direito, majongs, quiz, de pistola e outras coisas incompreensíveis. Dei de cara com uma imagem do passado. O jogo que aqui tentei explicar como era, com poucas e falhas informações, e tentamos, juntos, descobrir qual era o nome, surgiu no meio dos roms. Vários títulos foram citados, como esse ultimo do Edward, mas nenhum combinava com a minha lembrança.
    Quando vi o nome Finalizer – Super Transformation nada suspeitei. Passou a tela do titulo. Insert Coin. Welcome to The Earth. Mais um shmups tradicional dos anos 1980. Quando o peguei o primeiro “power”, foi como encontrar um amigo de infância.
    Agradeço a todos que participaram da caçada ao jogo perdido. Agora tenho muito que colocar em dia com esse velho parceiro...

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    1. Que bom que essa busca teve um final feliz.
      :)
      Eu fiquei curioso, mais tarde darei uma olhada nesse jogo!

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